O cinema de Margarida Cordeiro e António Reis no Rainha Sofia
Dentro da programação audiovisual deste mês, o Museu Rainha Sofia de Madrid oferece um ciclo de dois interessantíssimos cineastas portugueses: Margarida Cordeiro e António Reis. Estes dois autores do cinema português do pós 25 de abril de 1974, afastam-se nos seus filmes da corrente urbana imperante no momento, criando uma linguagem cinematográfica poética, de uma grande sensibilidade, que marcará o rumo de uma longa tradição de cinema radical em Portugal.
António Reis
Antes de ser reconhecido no seu país como um visionário da nova geração de cineastas dos anos oitenta e noventa, António Reis tinha destacado como poeta. Manoel de Oliveira convidou-o para trabalhar com ele e com Paulo Rocha na sua primeira obra maestra radical, “Acto de Primavera” (1962) e este cinema etnográfico e poético definido por ambos, marcou o desenvolvimento das quatro obras que Reis dirigiu com a sua esposa, a psiquiatra Margarida Cordeiro, e que se projectam neste ciclo junto a “Acto de Primavera”.
Cordeiro e Reis apartaram-se da tendência da época que se centrou no urbano, optando por um cinema que retrataba a vida de uma das regiões que sofria o despoblamiento mais feroz desses anos: Trás-os-Montes. A intenção dos cineastas consistia em mostrar que a região mais pobre e castigada do país, era precisamente aquela cujos símbolos se tinham perpetuado visivelmente ao longo do tempo.
Nas suas obras, examinam o microcosmos camponês de uma maneira quase antropológica. Segundo disse o próprio António Reis: «ninguém pode saber o que suporia fazer um filme deste tipo. Implicaria uma luta corpo a corpo entre formas ancestrales e modernísimas, entre lobos e Peugeot 504, entre arados neolíticos e botijas de gás».
Algo peculiar no seu cinema é que as sequências se articulam com frequência em torno do sentido do tacto. A composição laberíntica dos seus filmes fascinou a colegas como Jean Rouch, Joris Ivens ou Jacques Rivette.
Este ciclo, comissariado por Manuel Asín, apresenta o conjunto da sua obra, qualificada de radical, poética e chave na identidade do cinema português contemporâneo por cineastas como Pedro Costa, João Cesar Monteiro y João Pedro Rodrigues.